quarta-feira, 25 de maio de 2016

Por que devemos ler para nossos filhos

Nouvelles de Robert-Robert
A leitura para crianças entrou na lista das orientações básicas que pediatras americanos devem passar aos pais durante as consultas. A importância dessa prática tornou-se oficial quando a Academia Americana de Pediatria (AAP) fez uma declaração recomendando que pais leiam aos filhos diariamente desde o berço, em 2015. Foi o primeiro movimento da entidade para integrar a medicina pediátrica e o desenvolvimento da linguagem.
A declaração destaca o papel dos livros infantis na aquisição do vocabulário e de outras habilidades de comunicação que devem preceder a alfabetização para garantir o bom desempenho escolar.
Com essa estratégia, os pediatras esperam reduzir as diferenças de linguagem entre crianças de famílias de alta e de baixa renda. No final de 2014, um estudo da Universidade de Standford concluiu que já aos dois anos é possível perceber diferenças no vocabulário de acordo com escolaridade e renda da família. Filhos de pais com níveis mais altos de educação conhecem, em média, 30% mais palavras nessa idade.
Como um estímulo isolado, os 15 a 20 minutos de leitura diária em família não garantem a educação literária. Seu sucesso depende de outros recursos que se complementam no lento e complexo processo de familiarização com a palavra escrita.
Juntamente com os livros, o diálogo, as canções e as rimas vão construindo no cérebro infantil o caminho que, mais tarde, vai facilitar a passagem para o universo das letras. Um universo que não se limita à decodificação dos símbolos: a relação saudável com a palavra escrita envolve a interpretação dos vários tipos de textos, uma capacidade restrita à minoria da população.
O fato é que aprender a ler é um processo extremamente complexo, que começa no momento em que os pais apresentam o primeiro livro para o bebê e se estende por toda a vida escolar. O cérebro humano se desenvolveu para dominar a linguagem verbal, mas não apresenta nenhuma sequer estrutura dedicada especialmente à compreensão da escrita. Ele precisa criar um circuito para possibilitar a leitura, envolvendo e conectando diversas regiões.
As mudanças provocadas pela leitura são tão profundas que afetam não apenas a atividade como a anatomia do cérebro. Tanto que parte de trás do corpo caloso (região que une os hemisférios cerebrais) é mais grossa em letrados, o que mostra forte aumento no fluxo de informações entre os hemisférios. Não apenas ao ler, como ao ouvir palavras, o lado esquerdo do cérebro é mais ativo nas pessoas com capacidade de leitura.
Trata-se, portanto, de uma transformação que não pode e nem deve acontecer de forma rápida ou precipitada. Apesar de muitos pais e escolas acreditarem que o sucesso na educação infantil está relacionado à alfabetização precoce, ela pode ser um dos problemas da construção fraca desse novo circuito.
O autor de livros infantis e especialista em leitura Mem Fox defende que "mil livros sejam lidos às crianças" antes que elas comecem a ler. Isso não significa comprar todos os títulos infantis do mercado: repetições são válidas e importantes nessa fase da infância. Para crianças é uma grande satisfação poder prever o que vai acontecer na história e se familiarizar com as palavras e expressões do livro.
Seja qual for o tempo de cada um, a ampliação da capacidade cerebral requer muita prática e o desenvolvimento de todas as áreas que abrange. E isso não se consegue ensinando bebês a ler, mas lendo para eles, mostrando a eles, de forma incansável, toda a riqueza de significados e possibilidades que a língua oferece.

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